Rádio Reverberação

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O falso cânone literário como fuga do não pertencimento


O famigerado cânone... eu acho que isso não existe mais. Em tempos de modernidade líquida e sua hiper-relativização do tempo, espaço, conceitos, valores e doutrinas está cada vez mais difícil de fazer uma listinha do que é bom e do que não é. Aliás, na era da informação em tempo real, da altíssima produção acadêmica e literária está cada vez mais difícil não seguir o tal cânone. Há poucos dias li uma reportagem dizendo que o professor do ensino básico lê pouco, e quando lê são sempre os mesmos “clássicos”, muitas vezes por obrigação que os currículos impõem ao docente e que acaba afetando os alunos que também só leem aquilo que são obrigados. O que há de novo? Quais são os grandes nomes da literatura atual? (esquerda, direita, frente, retaguarda...) Vejo hoje um enorme medo do não pertencimento, de ler as coisas erradas, ou ficar fora do grupo que acha que lê a coisa certa. Não acredito de modo algum que Dostoievski, Baudelaire e Machado de Assis não devam ser lidos, muito pelo contrário, só não entendo porque eu necessariamente tenho que achá-los melhores do que Philip K. Dick, Isaac Asimov ou Michael Crichton. A ideia de erudição fica cada vez mais restrita aos que assistem Jean Renoir, mesmo não conhecendo absolutamente nada de cinema francês da década de 1930, do que aqueles que preferem Robert Zemeckis e conhecem todas as referências do universo “De Volta Para o Futuro”. A cultura do “parecer ser” é, em tempos de conservadorismo político, tão forte que se acredita piamente que Goethe resolve os problemas de nossa contemporaneidade. Reafirmo que os grandes clássicos são chamados assim não é à toa, têm seu enorme valor dentro da história mundial, devem e merecem ser estudados. No entanto, em pleno ano de 2013 devemos ainda ter uma visão cristã para definir os cânones de nosso tempo?! Para sermos diferentes e começarmos a aprender pra que servimos no mundo hoje temos que parar de construir uma erudição vazia de sentido e inserir no cânone (se é que ele existe, eu acho que não) o que Também é bom fora do óbvio, mesmo que seja popular, afinal... nem tudo que é produzido pela e para a elite tem qualidade garantida.

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